Marina: 28 anos de Furnas com os olhos no futuro
Celebrados no Dia Internacional da Mulher. Naturalmente.
As Furnas, na sua primeira configuração, existe deste que altura?
A história das Furnas, antes de ser o que é que hoje, existe desde os anos 40 onde havia apenas a furna e uma barraquinha. Depois, nos anos 60, este passou a ser um espaço com uma estrutura instalada dentro das grutas – onde, não sei bem como, serviam-se refeições.
Quando o Alexandre comprou o restaurante, eu lembro-me do meu avô dizer que vinha cá petiscar aos fins-de-semana, porque já era um hábito das pessoas de Lisboa. Mas na altura nem me lembrei de lhe perguntar “Avô, mas aquilo estava sempre aberto? Então e se houvesse maré cheia, como é que as pessoas iam para ali?” Já não fui a tempo.
Quando o Sr. Alexandre comprou o restaurante, a Marina começou desde logo a apoiá-lo neste projeto?
Quando o Alexandre comprou o restaurante na década de 80, nós ainda não éramos casados na altura, mas já namorávamos. Não comecei logo… Só vim para cá ajudá-lo há cerca de 28 anos, no momento em que a casa passou de uma estrutura pré-fabricada em barracão para algo mais próximo ao que é hoje, em cimento.
Na altura, quais eram os pontos mais importantes para a Marina dar apoio no restaurante?
Foi sobretudo trabalho de escritório. Eu sendo organizada e metódica, fiquei encarregue da gestão de fornecedores, fatura, contabilidade…
Na realidade, o contacto com pessoas nunca foi o meu forte: sou mais introvertida, gosto de estar no meu cantinho. Já o meu marido é precisamente o contrário! Fizemos, por isso, uma boa divisão de tarefas logo desde início.
E resistiu ao desafio ou aceitou-o logo?
Este meu envolvimento no projeto acabou por acontecer de forma natural, devido também ao nosso contexto familiar.
Sempre quisemos que eu estivesse por perto e com disponibilidade para, se nos apetecesse, tirarmos dois dias de férias e ir para algum lado. Se eu estivesse a trabalhar por conta de outrem, provavelmente este alinhamento de agendas não seria possível. No fundo, esta foi a melhor decisão para toda a família.
Ao longo destes 28 anos, quais os momentos que, para a Marina, foram fundamentais na evolução das Furnas?
Primeiro houve um grande investimento para transformar uma barraca da Estrada do Guincho num restaurante de pedra, assegurando uma construção sólida com bons equipamentos. Queríamos preservar a ideia da Marginal, para quem vinha de Lisboa, e, por isso, desenhámos desta forma este muro de pedra.
No Verão, a esplanada sempre foi o principal fator de atração. Estando mau tempo, as pessoas não pensam tanto no mar, mas mais em restaurantes interiores, mais acolhedores. Por isso, há 10 anos a esta parte, termos apostado numa arquiteta que já tinha trabalhado com alguns restaurantes emblemáticos. A ideia que lhe transmitimos foi muito simples: virar as Furnas para dentro porque o lado de fora estava sempre garantido.
Nesse sentido, foram introduzidos elementos de cores mais quentes, como a lareira, em contraste com tons mais frescos como o verde. Tudo para que o restaurante tivesse um aspeto mais aconchegante e proporcionasse uma experiência mais confortável aos clientes.
Igualmente importante foi a aposta numa cozinha que fidelizasse as pessoas e, a partir daí, trabalhar na manutenção dessa constância. Tínhamos noção de que o restaurante iria ser uma marisqueira, mas não queríamos vender só marisco, como a maior parte dos restaurantes. A ideia era equilibrar entre peixe e a seleção de outros bons produtos e bons profissionais para que, passo a passo, pudéssemos construir clientela fixa.
Nesse sentido, qual o papel da equipa das Furnas na consolidação do projeto?
São pedras basilares, como uma família onde todos são importantes. Por exemplo, o chefe de cozinha tem quase 30 anos de casa e foi ele quem criou a nossa carta. Ele e mais dois chefes de cozinha, assim como o chefe de sala e algumas raparigas da copa, mantêm-se connosco quase desde o início até hoje. Eles são a própria recordação e história das Furnas.
Mas claro, muito partiu da presença do meu marido que estava aqui de manhã, à tarde e à noite. Na verdade, se eu não trabalhasse aqui com ele, quase nunca estávamos juntos. Eu vinha cá ter e jantava com os miúdos para podermos ter uns momentos em família.
Hoje a realidade é outra. As coisas estão mais sedimentadas…
Quando isto entra num carril, tudo se torna mais fácil. A estrutura está feita. É só saber manter. Nós continuamos atentos para que nada falhe e para que continuemos a dizer “é isto que queremos fazer”. Daí ser mais fácil para nós, hoje em dia, ausentarmo-nos e descansarmos. Ter o restaurante aberto todos os dias do ano torna-se muito cansativo.
No caso dos meus filhos, eles estão aqui por meio tempo (almoços e jantares) porque eu assim o quis. Um projeto destes é extremamente intenso e, nos dias de hoje, a noção de família é diferente. Eles têm a própria vida pessoal, com os seus interesses e projetos.
Falando dos seus filhos, temos 3 crianças que acabam por crescer nas Furnas…
Na altura do meu casamento, eu tinha o restaurante há pouquíssimo tempo (nem há 1 ano) por isso até podemos dizer que as Furnas foram o meu primeiro bebé: depois veio a Marta, o Miguel e o Titó!
Curiosamente, o meu marido considerava que não devia haver continuidade no restaurante porque ele reconhece o sacrifício de muitas horas num trabalho duro como é o da restauração. Mas a vida quis que o Miguel e o Titó escolhessem gestão hoteleira. Ao mesmo tempo, eles também perceberam que o pai precisava de ajuda e abraçaram a responsabilidade de se envolverem no projeto.
Existe, portanto, a perspetiva de uma continuidade das Furnas do Guincho, sendo que eles terão a oportunidade de decidir se querem prosseguir ou não com este caminho. O futuro está em aberto.
O Miguel e o Titó já compreendem o esforço necessário para dar continuidade ao projeto das Furnas?
É engraçado porque eles já percebem que, se não estiverem presentes, as coisas não funcionam da mesma maneira. Isso era algo que não acontecia até agora. Eles viam a ausência do pai e assumiam que ele se calhar estava no restaurante porque queria estar. Ambos percebem agora que é importante estar sem pressa para sair, como costumo dizer. E, de facto, sentimos que os próprios clientes valorizam esta presença.
Tendo o meu marido feito essa ponte ao longo dos anos, os clientes acham imensa graça à nova ‘passagem de testemunho’. Simultaneamente, os filhos são mais novos, mais qualificados e fazem contribuições importantes para o negócio.
E qual é o papel da Marina nestas novas dinâmicas?
Eu estabeleço um pouco a ponte entre gerações e, não menos importante, tenho a cargo os bastidores que são fundamentais para os clientes manterem uma relação de proximidade com o restaurante.
Em particular, a questão da comunicação e das novas tecnologias, a que o meu marido nunca prestou grande atenção. A realidade é que há novas ferramentas com peso no negócio e, a pouco e pouco, ele vai percebendo as mais-valias de apostar nelas.
Nesse processo, que diferenças sentiram no público que visita as Furnas do Guincho?
Quando foi criado o site do restaurante, começou-se a perceber que havia cada vez mais marcações diretas de estrangeiros (por e-mail ou telefone) e não só pelo turista que vem aqui explorar a zona. A criação de um site foi um grande passo para atrair outro tipo de públicos, o que tornou o negócio muito mais dinâmico.
Quais são os planos para as Furnas do Guincho e da Marina?
Os planos para as Furnas é que os filhos tenham muitas ideias… A nível pessoal, o objetivo é ter projetos para além das Furnas, novamente a dois.